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Márcia Araújo15/07/2025 07:21
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“Scrum : a arte de fazer o dobro do trabalho na metade do tempo”

    Este artigo tem como objetivo a realização de uma análise crítica acerca do livro “Scrum : a arte de fazer o dobro do trabalho na metade do tempo”. O desenvolvimento de software exige, cada vez mais, métodos ágeis que possibilitem entregas eficientes, contínuas e com foco no valor real para o usuário.

    Diante desse cenário, o método Scrum tem ganhado destaque por sua capacidade de transformar equipes, processos e resultados. O livro “Scrum: a arte de fazer o dobro do trabalho na metade do tempo”, de Jeff Sutherland, co-criador da metodologia. A obra foi sugerida no Curso da DIO sobre SCRUM, bem como no curso “Scrum no Contexto do Serviço Público”, promovido pela ENAP, sendo, portanto, relevante tanto na formação acadêmica quanto na aplicação prática no setor público. A leitura ocorreu durante o mês de junho, sendo finalizada no dia 13 de julho de 2025.

    Ao relatar, entre outros exemplos, como Jeff Johnson e Chad Fulgham reformularam o sistema do FBI por meio da aplicação do Scrum, os autores apresentam de forma clara não apenas os fundamentos da metodologia, mas também os impactos concretos de sua adoção. A proposta deste trabalho é refletir criticamente sobre esses aspectos, relacionando os aprendizados do livro com a vivência acadêmica no Curso Superior de Engenharia de Software, buscando compreender de que forma os princípios do Scrum podem ser integrados ao desenvolvimento de soluções tecnológicas e à gestão eficiente de projetos.

    O livro Scrum: a arte de fazer o dobro do trabalho na metade do tempo, de Jeff Sutherland, destaca-se não apenas por apresentar um método de gestão ágil, mas por desafiar paradigmas profundamente enraizados na forma tradicional de trabalhar. Ao narrar casos reais, como o fracasso do sistema Virtual Case File (VCF) e a reviravolta no projeto Sentinel do FBI, a obra evidencia que não é apenas a tecnologia que precisa mudar, mas sobretudo a mentalidade das organizações.

    O ponto central do livro é a proposta de ruptura com o modelo de gestão linear, conhecido como modelo em cascata, em que todas as etapas do projeto são definidas previamente e seguidas rigidamente, muitas vezes ignorando as mudanças que ocorrem no meio do caminho. Sutherland mostra que, em ambientes complexos e imprevisíveis, esse modelo se torna não apenas ineficaz, mas perigoso, pois mascara falhas e consome recursos preciosos até que seja tarde demais para corrigir o rumo. Foi exatamente isso que aconteceu com o FBI: milhões de dólares desperdiçados e nenhuma solução funcional entregue.

    Diante desse cenário, o Scrum surge como uma alternativa eficaz. Conceitualmente, o Scrum é um framework ágil criado para ajudar equipes a resolverem problemas complexos, entregando produtos com o máximo de valor no menor tempo possível. Inspirado no Manifesto Ágil (2001), o Scrum foca em princípios como colaboração, adaptação contínua, foco em valor e iteração constante. O termo “Scrum” vem do rúgbi, e simboliza o trabalho em equipe coordenado e intenso em direção a um objetivo comum.

    O funcionamento do Scrum se dá por meio de ciclos curtos de trabalho, chamados de Sprints, normalmente com duração de duas a quatro semanas. Cada Sprint começa com uma reunião de planejamento (Sprint Planning), na qual a equipe define o que será entregue naquele ciclo, sempre com base nas prioridades do Product Owner (responsável pelo produto). Ao final do Sprint, ocorre a Sprint Review, onde os resultados são demonstrados para os stakeholders, e a Sprint Retrospective, momento em que a equipe reflete sobre o processo e propõe melhorias.

    Um exemplo notável do livro é o momento em que Chad Fulgham decide reformular o projeto Sentinel utilizando Scrum. Ele propõe uma equipe interna reduzida, focada na entrega contínua de partes funcionais do sistema. Com esse novo modelo, eles conseguem entregar a parte mais complexa do sistema em apenas um ano e com custo reduzido. Isso demonstra uma das maiores forças do Scrum: a entrega incremental e adaptativa, que permite à equipe se ajustar ao longo do caminho, incorporando feedbacks e eliminando desperdícios.

    Além disso, a obra destaca um aspecto fundamental: a importância das demonstrações regulares. No caso do Sentinel, a cada duas semanas a equipe apresentava seu progresso a um público exigente — agentes do FBI, membros do Congresso, representantes de outras agências governamentais, entre outros. Esse processo constante de “mostrar e contar” não apenas garantiu transparência, mas criou uma cultura de responsabilidade e melhoria contínua. Nas palavras de Sutherland, essa era “a parte mais eficaz do Scrum”.

    Outro conceito essencial do Scrum que o livro aborda com clareza é o papel da auto-organização das equipes. Diferentemente do modelo hierárquico tradicional, o Scrum valoriza equipes multidisciplinares e autônomas, que decidem em conjunto como alcançar os objetivos do Sprint. Essa abordagem, aliada à transparência, inspeção e adaptação, forma o tripé que sustenta o processo Scrum. A transparência garante que todos vejam o que está sendo feito, a inspeção permite avaliar o progresso, e a adaptação corrige o curso sempre que necessário.

    O livro também discute obstáculos comuns à adoção do Scrum, como a resistência à mudança, a cultura organizacional rígida e a dificuldade em abandonar planejamentos detalhistas e engessados. Isso é especialmente relevante no contexto do serviço público, onde a cultura de controle ainda é predominante. Nesse sentido, o curso da ENAP “Scrum no Contexto do Serviço Público” reforça a viabilidade da aplicação da metodologia em ambientes burocráticos, desde que haja disposição para revisar processos, valorizar a colaboração e adotar ciclos curtos de entrega.

    Contudo, uma análise crítica exige reconhecer que o livro apresenta o Scrum de forma bastante otimista, quase como uma “solução universal”. Apesar de seu sucesso comprovado em diversos setores, a eficácia do Scrum depende fortemente de fatores como maturidade da equipe, clareza de propósito, apoio da liderança e ambiente propício à experimentação e ao erro. Sem esses elementos, há o risco de a implementação se tornar apenas mais um processo burocrático disfarçado de ágil.

    No contexto do Curso Superior de Engenharia de Software, a leitura do livro é extremamente pertinente. Os futuros profissionais da área precisam estar preparados para atuar em ambientes de incerteza, onde a flexibilidade, a entrega contínua e o foco em valor são diferenciais estratégicos. O Scrum oferece uma base sólida para esse tipo de atuação, desde que acompanhado de uma mudança de mentalidade organizacional e do comprometimento com a melhoria contínua.

    Em suma, o livro cumpre seu propósito de apresentar o Scrum de forma didática, inspiradora e fundamentada em exemplos reais. Ele desafia modelos ultrapassados e convida profissionais, gestores e estudantes a repensarem a maneira como o trabalho é organizado. Sua contribuição vai além da metodologia: é uma chamada para transformar culturas, formas de pensar e de agir — dentro e fora do setor de tecnologia.

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