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CLAUDIONEI AGUIAR
CLAUDIONEI AGUIAR11/11/2025 08:55
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Engenheiro ou operador de ferramentas?

    A engenharia de software, outrora sinônimo de rigor técnico e compreensão profunda dos sistemas computacionais, parece ter se transformado em um rótulo distribuído com facilidade. Inspirado no provocativo artigo publicado por @all.technology.stories no Medium (“Onde está o engenheiro no engenheiro de software?”), este texto propõe uma reflexão sobre o estado atual da profissão — especialmente no contexto brasileiro — e o que realmente significa ser um engenheiro de software.

    🧠 Engenharia ou automação glorificada?

    No Brasil, o mercado de tecnologia cresceu exponencialmente nos últimos anos. Startups surgem aos montes, e com elas, uma demanda voraz por desenvolvedores. Mas será que estamos formando engenheiros ou apenas operadores de ferramentas?

    Hoje, é comum ver profissionais que se intitulam “engenheiros de software” sem saber explicar o funcionamento de um loop, o conceito de ponteiros ou o que acontece por trás de uma chamada de API. Muitos se apoiam em frameworks e bibliotecas sem entender os fundamentos que sustentam essas abstrações. Como bem pontuado no artigo original, “costumávamos construir coisas. Agora nós os configuramos”.

    🔍 A superficialidade como padrão

    A realidade brasileira não é muito diferente da descrita no texto. Cursos rápidos, bootcamps e tutoriais no YouTube formam profissionais que sabem “fazer funcionar”, mas não sabem “por que funciona”. O uso de ferramentas como React, Docker e AWS Lambda é comum, mas poucos sabem o que é o DOM, como funciona um contêiner ou o impacto da latência de inicialização a frio.

    Essa dependência de abstrações cria um vício perigoso: estamos nos abstraindo na irrelevância. E quando algo quebra fora do “caminho feliz”, muitos entram em pânico. A depuração vira um ritual de reiniciar o terminal até o erro desaparecer.

    🧱 Engenharia exige fundamentos

    Engenharia, em qualquer área, exige compreensão, responsabilidade e tomada de decisões com base em restrições reais. Um engenheiro civil não constrói pontes com base em tutoriais genéricos. Ele estuda tensão, compressão, materiais e modos de falha. Por que no software seria diferente?

    No Brasil, ainda há profissionais que honram o título. Estão nos bastidores, lendo RFCs por diversão, escrevendo scripts bash que resolvem problemas reais, depurando vazamentos de memória com ferramentas de profiling. Eles não apenas escrevem código — eles projetam soluções.

    📚 O caminho de volta à engenharia

    Se queremos continuar nos chamando de engenheiros de software, precisamos resgatar a disciplina. Isso significa:

    • Estudar os fundamentos da computação: estruturas de dados, algoritmos, sistemas operacionais, redes.

    • Entender como o computador executa o código, não apenas como usar uma biblioteca.

    • Projetar soluções que resistem à carga e ao tempo, não apenas que funcionam na demo.

    • Escrever testes, documentar, pensar em arquitetura e confiabilidade.

    🧭 Conclusão: a decisão é nossa

    Como bem finaliza o autor do artigo original, “a palavra engenheiro implica disciplina, compreensão e responsabilidade”. No Brasil, onde o título de engenheiro ainda carrega prestígio, é hora de honrá-lo com prática e conhecimento. Podemos continuar construindo pontes metafóricas com fita adesiva — ou podemos projetar sistemas robustos que resistem ao tempo e à pressão.

    A decisão é nossa.

    Referência:

    Texto original por @all.technology.stories no Medium.

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    Comentários (2)
    DIO Community
    DIO Community - 12/11/2025 09:11

    Excelente, Claudionei! Que artigo cirúrgico, inspirador e urgente! Você tocou no ponto crucial da Engenharia de Software hoje: a perigosa transformação do Engenheiro em um mero Operador de Ferramentas.

    É fascinante ver como você aborda o tema, mostrando que a superficialidade (saber configurar, mas não por que funciona) é o que causa o vício perigoso da dependência de abstrações e o pânico quando o código quebra fora do "caminho feliz".

    Qual você diria que é o maior desafio para um desenvolvedor ao trabalhar com um projeto que usa o padrão MVC, em termos de manter a separação de responsabilidades e de evitar o acoplamento entre as três camadas, em vez de apenas focar em fazer a aplicação funcionar?

    Fernando Araujo
    Fernando Araujo - 11/11/2025 11:18

    Ótimo e oportuno texto, Claudionei!!

    Eu tenho graduação em Engenharia Elétrica (concluí em 86) e também em Ciências da Computação (concluí em 95), em uma universidade federal, pública. E eu sei o que é preciso para se tornar um Engenheiro.

    Concordo com você quando diz que os cursos de hoje (há exceções, claro)estão deixando a desejar no rigor técnico de formar Engenheiros (de software, de computação, de automação, para ficar na nossa área).

    Não só os cursos, mas os alunos também (há exceções, claro!) estão se contentando em fazer cursos cada vez mais curtos e de conteúdos enxutos.

    Mas eu entendo a pressa deles: em época de poucas vagas de emprego, a pressa de terminar um curso mais rápido, nem que seja para aprender a apertar alguns botões ou configurar uns ambientes (como você diz), e ir logo em busca do primeiro emprego faz sentido!.Aprende o grosso na prática mesmo, depois de contratado!

    E olha que eu nem falei da mais nova "Profissão" de Engenheiro: Engenheiro de Prompt! Essa não tem nada de Engenharia, só basta saber escrever bem, em português mesmo! É só descrever bem uma pergunta, determinar o contexto e delimitar o formato e escopo da resposta. O que isso tem de Engenharia???

    Eu até escrevi um artigo aqui questionando essa profissão.

    Engenharia de prompt é uma profissão?

    (https://web.dio.me/articles/engenharia-de-prompt-e-uma-profissao?back=/articles)

    Mas vamos esperar melhoras...

    OBS. - Não encontrei o artigo indicado na sua postagem. Poderia colocar o link direto aqui, por favor?